Mercado de trabalho e a Covid-19: um cenário desafiador para estados e municípios
- Sondagem Paraíba
- 16 de out. de 2020
- 5 min de leitura
Atualizado: 20 de out. de 2020
15/10/2020

Tamires Emanuele A. de Oliveira
Wanderleya dos Santos Farias
Em março de 2020, o novo coronavírus, denominado de SARS-CoV-2, foi caracterizado pela OMS como uma pandemia. Desde então, esta enfermidade epidêmica tem gerado crises sem precedentes na saúde e nas economias nacional e internacional, atingindo assim, os mais diversos setores e grupos populacionais. No entanto, especialistas já alertam que a crise não alcança a todos da mesma maneira e pode acirrar ainda mais as desigualdades sociais e do mercado de trabalho.
O mercado de trabalho brasileiro é marcado pela forte presença da informalidade. Em geral, as pessoas que ocupam trabalhos informais são inseridas de forma precária no mercado de trabalho, uma vez não têm acesso à proteção social e trabalhista regulamentada pelo Estado. Segundo o IBGE, os trabalhadores por conta própria, empregos intermitentes, trabalhador doméstico sem carteira assinada, microempreendedores individuais, trabalhadores de aplicativos digitais, entre outros, podem ser citados como exemplos de atividades informais no Brasil. Os níveis de rendimentos auferidos pelos trabalhadores informais, em geral, são mais baixos do que um empregado com carteira assinada e os informais estão mais expostos à pobreza e exclusão do sistema de proteção social.
Entre os anos de 2003 a 2014, o mercado de trabalho do país, a despeito de suas distorções estruturais, conseguiu ampliar o processo de formalização do trabalho. Em 2012, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua (PNADC), a taxa de formalidade era de 56,6%, o que correspondia a um aumento de 13,9 pontos percentuais na formalização do trabalho em dez anos. No entanto, com a crise política e econômica que o país ingressou a partir de 2015, houve uma retração no mercado formal. Em 2019, a subutilização da força de trabalho alcançava 25% da população ativa.
A Covid-19 chegou ao Brasil no final de fevereiro de 2020 num contexto em que o país experimentava uma lenta recuperação econômica. A pandemia se disseminou de forma rápida pelas regiões do país. Diversos segmentos do setor produtivo da economia tiveram que reduzir drasticamente suas operações para evitar o agravamento da crise sanitária. Apesar das ações adotadas pelo governo federal para amortecer os efeitos da pandemia no mercado formal de trabalho, como a redução proporcional da jornada e de salário e a suspensão temporária do contrato de trabalho, os impactos adversos sobre o nível de desocupação foram significativos e ainda persistem.
Entre janeiro e agosto de 2020, as demissões que ocorreram no mercado formal de trabalho brasileiro se concentraram, na região Sudeste (717.224), o que representou cerca de 53,5% do total de desligamentos ocorridos no país. A região Sul ficou em segundo lugar com 20,7% dos desligamentos, totalizando 289.658 demissões e o Nordeste ocupou a terceira posição (186.208) com um percentual de 13,3% em relação ao total do país.

Segundo os dados do Novo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), o saldo do emprego formal no Brasil, no acumulado de janeiro a agosto de 2020, foi negativo em 849.387 pois, ao longo dos referidos meses, ocorreram 9.180.697 admissões e 10.030.084 demissões. O estoque do emprego formal recuou, sobretudo, no setor de serviços. Como foi o mais afetado pelas medidas de distanciamento social impostas pela pandemia do novo coronavírus, o setor fechou 489.195 vagas entre os referidos meses. Esse setor agrega diversos segmentos e alguns sofreram mais pesadamente os impactos da pandemia.
Os serviços de alojamento e alimentação apresentaram um saldo negativo de nada menos que 348.592 postos de trabalho. Ressalta-se que estabelecimentos como hotéis, pousadas, restaurantes, bares, lanchonetes, entre outros, estão inclusos nesses segmentos, onde a necessidade do contato presencial é maior. Com as normas de isolamento social estabelecidas para conter o avanço da pandemia, muitos empreendimentos fecharam suas portas e a reabertura se dá ainda de forma bastante gradual.

O segmento de transporte, armazenagem e correios exibiu um recuo no emprego formal de 94.184. Os segmentos de Informação, Comunicação, Atividades financeiras, Imobiliárias, Profissionais e Administrativas apresentaram um saldo negativo de 58.770. O saldo também foi negativo na indústria, que revê um declínio de 107.024 postos de trabalho. Mas outros setores da economia estão exibindo um aumento na contratação de trabalhadores formais. A agropecuária conseguiu ampliar o seu estoque de emprego formal, abrindo 98.520 novas vagas de trabalho no acumulado de janeiro a agosto. Na mesma direção, o setor da Construção Civil teve 58.464 novas contratações no período.
Além da dimensão espacial da Covid-19, é evidente que estamos vivenciando um período de fragilização das condições de trabalho e emprego para a classe trabalhadora em geral, mas, é perceptível que a pandemia afeta principalmente setores em que as mulheres estão alocadas, onde as mesmas já sentem uma série de dificuldades, subjugações e desigualdades. Em entrevista concedida ao Brasil de Fato este ano, Thais Lapa, pesquisadora na área de gênero e trabalho, informa que existe uma desigualdade estrutural nas condições de trabalho e formas de contratação, devido à segregação de gênero e que leva a mulheres estarem mais presentes em trabalhos insalubres e precários.
Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC) Contínua), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgada em agosto, no segundo semestre de 2020, a taxa de desocupação foi 12,0% para os homens e 14,9% para as mulheres. Desemprego em massa e salários menores em setores que concentram um grande número de trabalhadoras do sexo feminino são alguns dos problemas dos quais deixam as mulheres mais vulneráveis nesse período de pandemia, evidenciando as consequências diferenciadas da crise para homens e mulheres.
Uma vez que mulheres e homens não ocupem os mesmos espaços e postos no mercado de trabalho, e estando as mulheres concentradas em ocupações de menor nível de proteção social e remunerações, é fundamental que os órgãos governamentais tenham conhecimento de quais os grupos mais atingidos, para que as políticas econômicas e sociais sejam pensadas de modo a evitar um cenário ainda mais desfavorável e conseguiam diminuir a desigualdade de gênero.
Também é importante destacar que na maior parte das unidades federativas do país os rebatimentos da pandemia sobre o mercado de trabalho foram bastante adversos. Muitos estados e municípios sentiram os efeitos da retração econômica e o conseqüente recuo do nível de ocupação da força de trabalho. A Paraíba apresentou um saldo negativo de 8.445 postos de trabalho entre janeiro a agosto de 2020. No mesmo período, a capital do estado paraibano, João Pessoa, exibiu uma perda de nada menos que 6.105 empregos. O cenário é preocupante e a capacidade de resposta à crise vai depender da forma como os governos ao nível local e nacional irão se articular em torno de medidas efetivas para a recuperação da economia e do mercado de trabalho.
Projeto de Extensão - Diagnóstico Socioeconômico e Ambiental de Municípios Paraibanos - Curso de Economia/UFPB
Núcleo de Políticas Públicas e Desenvolvimento Sustentável - NPDS
LATWORK: Projeto internacional para desenvolver as capacidades de pesquisa e inovação das instituições de ensino superior da América Latina para análise do mercado informal de trabalho
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